
Apesar de leve queda em outubro, o endividamento e a inadimplência das famílias, ainda está alto no Brasil. A última Pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) revelou que 79,2% das famílias brasileiras estão endividadas e 30,3% estão com pagamento de contas em atraso.
As famílias de baixa e média renda, que recebem até 10 salários mínimos, estão mais endividadas, com 80,2%. Além disso, essas famílias também estão na faixa com um grande percentual de atraso de dívidas, com 33,6%. A grande preocupação é que as dívidas acabem comprometendo a subsistência dessas famílias.
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Sobre esse tema, o advogado Ricardo Maranhão explica a Lei do Superendividamento (Lei 14.181/2021) ― que atualizou o Código de Proteção e Defesa do Consumidor (CDC), de julho de 2021. Ela foi criada com intuito de tratar sobre a repactuação de dívidas e a concessão de crédito. No entanto, segundo o advogado, ainda existem muitos debates em torno desta lei.
“Primordialmente, essa lei tem como objetivo viabilizar a negociação de débitos. Semelhante ao que acontece com as negociações de empresas em recuperação judicial. A legislação visa disciplinar a concessão de crédito e a negociação de débitos com os credores, possibilitando a conciliação coletiva entre o devedor (pessoa física), com os credores, que nesse caso são as lojas, os bancos, empresas etc. Com essa lei, por exemplo, o consumidor pode renegociar suas dívidas em bloco, ou seja, reunir todos os credores para fazer uma oferta de pagamento de uma vez só”, explica ele.
Os superendividados também têm direitos
“O consumidor pode, na forma do artigo 104-C da Lei, recorrer aos órgãos do Sistema Nacional de Defesa do Consumidor, que pode ser o Procon, a Defensoria Pública e o Ministério Público, para administrativamente obter orientação sobre como fazer essas negociações. De maneira geral, na negociação da dívida o consumidor apresenta um plano de pagamento, ou seja, a maneira pela qual pretende pagar as dívidas”, completa.
“Combinando esse artigo com o 104-A, verificamos que esse plano pode ser feito administrativamente ou através de uma ação de repactuação de dívidas. O devedor deverá apresentar propostas de pagamento para o prazo máximo de cinco anos. Caso não haja acordo entre o consumidor e credores, poderá ser instaurado o processo por superendividamento, conforme reza o artigo 104-B da Lei. Nesta hipótese, quem determinará prazos, valores e formas de pagamento será o juiz”, explica Ricardo Maranhão.
A Lei 14.181/2021 define como “superendividado” o consumidor que, de boa-fé, assume sua impossibilidade de arcar com todas as dívidas que contraiu, porque isso afeta suas condições de sobrevivência. Essa Lei tem como um de seus principais escopos preservar o chamado mínimo existencial.
Na lista de dívidas que podem ser renegociadas por meio da legislação estão: consumo (carnês e boletos), contas de água, luz, telefone e gás; empréstimos com bancos e financeiras, com a inclusão de cheque especial e cartão de crédito, crediários e parcelamentos.
O que não pode ser renegociado, dentro do escopo da Lei são impostos e tributos, pensão alimentícia, crédito habitacional (prestação da casa própria), crédito rural e produtos e serviços de luxo. Na lista de possibilidade de negociação pela lei, o cartão de crédito era e continuou sendo em outubro a principal modalidade de endividamento, respondendo por 86,2% das pessoas endividadas no país, ainda segundo a CNC.
De acordo com Ricardo Maranhão a lei incentiva o uso de medidas de resolução de conflitos alternativas ao Judiciário, com conciliação e a mediação. O termo chave é “repactuação de dívidas”.
Determinando o mínimo existencial
O especialista ressalta ainda que há muitos debates, em especial no Supremo Tribunal Federal (STF), sobre o que a lei chama de “mínimo existencial” ― que seria a quantia mínima da renda de uma pessoa para pagar despesas básicas e que não pode ser usado para quitar dívidas.
Atualmente, esse mínimo existencial corresponde a 25% do salário mínimo, o que atualmente corresponde a R$ 303,00. O advogado ressalta que muitos juristas, o STJ, o STF acreditam que esse mínimo existencial, como é hoje, não é suficiente para contemplar os gastos básicos de uma família.
O tema do endividamento e da aplicação da Lei, tem se mostrado tão relevante que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) vai promover no dia 30 de novembro, um seminário sobre o tema, sob a coordenação do ministro Marco Buzzi e a presença de acadêmicos da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, da Fundação Getúlio Vargas e Universidade Estatual do Rio de Janeiro.
“Vão ser necessárias muitas reflexões e ações nessa questão do superendividamento e sobre a lei. Nessas mediações e conciliações que a lei propõe, temos um ponto sensível que é: os credores querem saber quem vai receber primeiro o valor devido, já que o consumidor se encontra numa situação de superendividamento. Mas aí, temos a questão do limite de quanto esse consumidor pode pagar, por que precisa sobrar para ele, o mínimo para sobreviver”, finaliza Ricardo Maranhão.
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